Se atendermos apenas à situação das famílias em Portugal, 70% das mulheres com filhos trabalham a tempo integral (OCDE, 2018)(13) e as taxas de emprego das mães não variam significativamente conforme a idade dos filhos. Isto significa que as mães de crianças entre os 0 e os 2 anos em Portugal têm mais ou menos as mesmas taxas de emprego que as mães com filhos mais velhos. Segundo dados da Pordata, em 2018, a taxa de mulheres a trabalhar em part-time é de apenas 12,3 %, prevalecendo assim o trabalho a tempo inteiro.
Como anteriormente foi referido, a questão da qualidade da educação entre os 0 e os 3 anos é uma condição necessária para que a frequência por parte das crianças da creche ou outra resposta possa trazer benefícios para as crianças, garantindo os seus direitos e um bom desenvolvimento e aprendizagem ao longo da vida. Assim, iremos abordar a questão da qualidade da resposta pedagógica, área que deve ser da preocupação do Ministério da Educação.
A qualidade da resposta aos 0-3 anos(14)
Para apoiar o caminho das pessoas [crianças, famílias] para fora da exclusão social e para garantir o seu bem-estar, torna-se necessária “uma capacidade de reconhecer e aceder à competência distribuída pelos sistemas locais e negociar as fronteiras de uma ação profissional responsável” (Daniels et al. 2007, p. 522), dando prioridade às crianças mais desfavorecidas e garantindo-lhes modalidades de atendimento de superior qualidade.
A educação de infância em Portugal encontra-se dividida quanto à natureza e funções dos serviços que presta. Dos 0 aos 3 anos ela é entendida como um serviço social com tutela do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e dos 3 aos 6 anos como serviço de educação tutelado pelo Ministério da Educação, sendo que apenas esta última é considerada parte do sistema educativo. Este sistema repartido tem fortes implicações na organização das instituições, nas condições de trabalho dos/as profissionais e nos objetivos e funções que se privilegiam em cada uma, estando sujeitos a diferentes sistemas normativos, de regulação da qualidade e a sistemas de financiamento diferenciados. A questão da segmentação ou unificação da rede, tem sido analisada por diversos relatórios internacionais (European Union, 2014; Eurydice, 2012). Dados de investigação sugerem que os sistemas integrados de educação de infância estão geralmente associados a uma maior qualidade, nomeadamente em termos de profissionalismo da equipa (Bennett, 2008; Kaga, Bennett & Moss, 2010), políticas coerentes de acesso, financiamento, currículo e equipas profissionais.
No sul da Europa, verifica-se uma tendência para responsabilizar o Ministério da Educação pelo atendimento das crianças dos 0 aos 3 anos - veja-se o caso de França, Espanha, Grécia, Itália – quer a iniciativa seja municipal, de serviços com caráter eminentemente social, de escolas da responsabilidade direta do Ministério da Educação, etc. No Reino Unido e na Alemanha têm-se vindo a registar algumas das mesmas tendências. Mas, o que se tem demonstrado claro é que, independentemente da iniciativa e âmbito de responsabilidade, a tutela pedagógica é da responsabilidade do Ministério da Educação que já desenvolveu, em grande parte dos países europeus, linhas pedagógicas orientadoras para o trabalho em creche. É importante contudo referir que a integração das respostas na educação deve acautelar a constituição de equipas especializadas na educação das crianças dos 0 aos 6 anos, sob pena de poder ter um efeito de antecipação de práticas de escolarização precoce, por contágio com outros níveis de educação (Kaga, Bennett & Moss, 2010).
Desde 2000 que diversos organismos têm vindo a recomendar que o Ministério da Educação assuma a monitorização da oferta e da qualidade da educação e cuidados prestados, assim como a qualidade das experiências conducentes ao desenvolvimento das crianças entre os 0 e os 3 anos (CNE, 2011; ME, 2000). O facto de esta valência nunca ter feito parte do sistema educativo português, permanecendo sob tutela do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, tem sido referido como uma preocupação por diversos peritos nacionais e internacionais (OCDE 2001; CNE, 2009). A sua desvalorização em termos de condições de trabalho e de reconhecimento do trabalho docente, bem como a falta de formação específica para estas idades na formação inicial e contínua de educadores/as, podem contribuir para a dificuldade em generalizar a qualidade da oferta nestas idades (Almeida, Aguiar & Pinto, 2012).
Em Portugal, estudos sobre a qualidade dos serviços de educação e cuidados para as crianças dos 0 aos 3 anos apontam para níveis mínimos ou inadequados de qualidade na generalidade das instituições (Aguiar & McWilliam, 2013; Barros, & Aguiar, 2010; Pessanha, 2008; Pessanha et. aI., 2007).
O Ministério da Segurança Social e do Trabalho produziu, em 2007 (revisto em 2010), sem a participação do Ministério da Educação, o Manual de avaliação da resposta social Creche (Instituto Segurança Social, 2010) que tem promovido alguma regulação da qualidade nestes estabelecimentos. Este manual valoriza esta faixa etária no que respeita às aprendizagens estruturantes que nela ocorrem e que se devem pautar por princípios de inclusão e de aprendizagens ativas, quer espontâneas quer planeadas por educadores/as de infância, em estreita colaboração com as famílias. No entanto, o MTSS não assume nunca de forma explícita a função docente dos/as educadores/as (Vilhena, 2011 citada em CNE 2011). Este referencial impõe ainda um processo de planeamento e avaliação altamente burocratizado, assente em lógicas administrativo-burocráticas, que nem sempre assenta em princípios pedagógicos de qualidade reconhecidos pelos especialistas na área. Acresce referir que este sistema de avaliação da qualidade assenta numa lógica de satisfação do cliente, em clara dissonância com os referenciais da Inspeção Geral da Educação do Ministério da Educação. Assim, instituições que recebem crianças entre os 0 e os 6 anos não possuem um quadro legislativo e regulador congruente.
O número de amas tem vindo a decrescer à medida que o número de creches aumenta, embora mantenha em alguns distritos uma expressão considerável: Bragança (14,8 %), Santarém (11,4 %) e Setúbal (12,8 %) (GEP-MSESS, 2012). No seguimento do trabalho da Comissão para a Política de Natalidade em Portugal (Azevedo, 2014) e com o objetivo de alargar este serviço, foi publicado, a 22 de fevereiro, o Decreto-Lei nº 2115/2015 que liberaliza e regula a atividade das amas, abandonando progressivamente a sua vinculação ao Estado. Lembramos que as funções estabelecidas para as amas não incluem a função de educação. Deixando estes/as profissionais de ter um acompanhamento permanente por parte de técnicos/as especializados (educadores/as de infância profissionais), vemos com especial preocupação as condições efetivas para prestarem um serviço de qualidade. Ao mesmo tempo, conferir aos familiares e às amas o estabelecimento do contrato de prestação de serviços e respetiva remuneração pode dar origem quer à degradação das condições de exercício da atividade, quer à diminuição de condições de acessibilidade por parte das famílias.
Cabe ainda referir a existência do Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) criado ao abrigo do Decreto-Lei nº 2281/2009, de 6 de outubro, o qual tem a missão de garantir a Intervenção Precoce na Infância (IPI). Este sistema consiste “num conjunto organizado de entidades institucionais e de natureza familiar, com vista a garantir condições de desenvolvimento das crianças com funções ou estruturas do corpo que limitam o crescimento pessoal, social, e a sua participação nas atividades típicas para a idade, bem como das crianças com risco grave de atraso no desenvolvimento”. É de realçar que o SNIPI funciona através da atuação coordenada dos Ministérios do Trabalho e da Solidariedade Social, da Educação e da Saúde, conjuntamente com o envolvimento das famílias e da comunidade, assumindo uma perspetiva sistémica de intervenção e uma especificidade para o trabalho com crianças até aos 6 anos, que é depois continuado no âmbito da Educação Inclusiva.
Apesar da existência de diversos tipos de respostas prevalece ainda alguma rigidez ou estandardização nos serviços de educação de infância em termos, quer de horários e condições de frequência, quer do tipo de organização dos grupos que são permitidos. Ao contrário do que acontece noutros países europeus, em Portugal é difícil, por exemplo, encontrar em meios urbanos uma vaga quando se opta pela frequência em part-time. A constituição de grupos heterogéneos em termos etários é, igualmente, pouco potencializada, principalmente em creches ou entre grupos de creche e de jardim de infância. A constituição de grupos com heterogeneidade etária é vista como um fator de qualidade, potenciando interações e experiências de aprendizagem mais ricas entre as crianças e com os adultos (Katz, 1998; Silva & Folque, 2016) como podemos ver pelo testemunho de uma educadora de infância.

A publicação da Portaria nº 2262/2011, de 31 de agosto, pelo Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, alterou as condições de frequência no que diz respeito ao número de crianças por sala, de 8, 10 e 15 crianças para 10, 14 e 18, respetivamente nas salas de berçário, 1 e 2 anos, em função da área da sala (2 m2/ criança). Tendo em conta a relação entre o número de crianças por grupo e a qualidade das interações adulto-criança (ex: Barros & Aguiar, 2010; Sílvia et al. 2016), consideramos que o aumento de crianças por grupo pode comprometer essas interações, sendo elas, como é sabido, um fator determinante da qualidade das experiências das crianças, bem como do desenvolvimento e aprendizagem ao longo da vida (Siraj-Blatchford et al., 2008, 2011).
Em Portugal, o/a educador/a de infância é o profissional que trabalha com crianças dos O aos 6 anos em contexto formal de creche e de jardim de infância, assumindo a responsabilidade dos grupos de crianças em estreita parceria com outros profissionais em contextos diferenciados de educação. Sendo um grupo profissional único, a sua identidade é necessariamente afetada pelas condicionantes do sistema e da sua evolução histórica, e pelas condições de trabalho diferenciadas, tal como já anteriormente foi evidenciado.
Quanto à formação inicial desses/as educadores/as de infância, a sua evolução para um nível superior de qualificação constituiu um fator positivo na construção da profissionalidade e do seu estatuto, bem como na qualidade do seu desempenho profissional. A formação profissional está associada a uma melhor qualidade pedagógica nomeadamente ao nível das interações adulto-criança (Barros et al. 2016).
No entanto, a formação decorrente do processo de Bolonha, delineada em três anos de licenciatura em educação básica (comum a educadores/as de infância, professores do 1º e 2º CEB) e complementada por um mestrado de três ou quatro semestres (Decreto-Lei n° 79/2014), tem surtido algumas reflexões críticas da parte da comunidade académica e profissional. Estas reflexões acentuam como positivo o reforço da formação científica e domínio dos instrumentos académicos, assim como a continuidade entre a Educação Pré-Escolar e outros níveis de ensino. Contudo, elas apontam, também, para algumas fragilidades especialmente no que se refere à formação de docentes para trabalhar com as crianças nos primeiros três anos de vida. Em alguns dos perfis de formação, os educadores de infância não têm formação especifica para trabalhar com estas idades, privilegiando uma formação marcadamente disciplinar, dando prioridade à continuidade com a educação básica e contrariando o caráter holístico da aprendizagem na educação de infância. Esta formação revela uma manifesta insuficiência da formação educacional geral que engloba os contributos da psicologia, da sociologia, da antropologia, da história da educação, da filosofia, da ética deontológica, etc. Também a formação para o trabalho com famílias é ainda uma fragilidade da formação atual. Ainda não se assumiu, em Portugal, a educação de infância com duplo enfoque: a criança e as suas aprendizagens e as famílias e o exercício da função parental/familiar num contexto comunitário verdadeiramente educativo. É exemplo deste aspeto a dificuldade em fazer acreditar ações de formação que se centrem em dimensões da profissão docente (Decreto-Lei nº 240/2001, de 30 de agosto) que vão para além da dimensão de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem, como por exemplo o trabalho com famílias e comunidades.
O relatório sobre o caso português do estudo “INTESYS - Serviços Integrados para a infância, apoiar crianças e famílias em situação de vulnerabilidade” refere-se no seu mapeamento/diagnóstico a uma necessidade de formação em certas áreas, para enfrentar problemas tais como: dificuldades no relacionamento interpessoal entre os profissionais e as famílias com quem trabalham em proximidade; alguma falta de consciência intercultural; falta de flexibilidade e capacidade de resposta dos serviços ou dos profissionais; algum autoritarismo por parte destes; falta de poder das famílias para influenciar os serviços e as suas práticas (INTESYS, 2019).
Não podemos ainda esquecer – apesar de não possuirmos dados estatísticos fiáveis - o “turn-out” das/os educadoras/es que, em busca de melhores condições de trabalho, mudam frequentemente de instituição procurando trabalhar em jardim de infância. Há salas de creche por onde passam ao longo do ano pelo menos três educadoras diferentes. Este facto é extremamente problemático em relação à vinculação e estabilidade de que necessitam as crianças dos 0 aos 3 anos de idade.
Tal situação é devida às condições de trabalho (horários, remuneração e progressão na carreira, acesso a formação) dos educadores de infância a trabalhar em creche que não veem ainda o seu estatuto, enquanto docentes, refletido em igualdade de circunstâncias face aos da educação pré-escolar.
Algumas das condições estruturais como o número de crianças por grupo, a falta de formação específica para o trabalho em creche e a desvalorização profissional dos educadores de infância que trabalham em creche face aos que trabalham na educação pré-escolar, podem igualmente estar associadas a uma pedagogia mais frágil, com excessiva rigidez na organização das rotinas diárias forçando as crianças a uma vivência em coletivo precoce (todas comem, dormem e vão à casa de banho ao mesmo tempo; prevalência de atividades de grupo face a atividades individuais ou de pequeno grupo), poucas oportunidades de brincar ao ar livre e de contacto com a natureza. Existem creches sem espaços exteriores e quando existem eles são pobres em materiais, experiências e desafios. As saídas dos bebés na comunidade, condição de uma vida social rica em interações e de participação enquanto cidadãos, são esporádicas. Esta invisibilidade da criança no espaço público dificulta ainda que a sociedade assuma as crianças como responsabilidade sua. Esta necessidade apela ainda a que as autarquias repensem as cidades no sentido de as tornar um espaço para todos.

Observam-se práticas pedagógicas em creche que desvalorizam o protagonismo da criança e a sua atividade exploratória privilegiando trabalhos homogéneos sob um excessivo controle por parte do adulto. Alguns estudos revelam que as salas de creche são mal equipadas ao nível de materiais, com pouca diversidade. Em algumas salas observam-se ainda alguns materiais longe do alcance das crianças e que são raramente utilizados pelas crianças, limitando as suas experiências (Barros et al. 2016).
A qualidade das interações adulto-criança, um dos aspetos mais significativos da pedagogia da infância, apresenta níveis médios ou mínimos de qualidade. Estudos recentes revelam que os adultos têm interações positivas e próximas com as crianças com níveis baixos de interações punitivas. Contudo, as oportunidades dos adultos de expandirem as experiências das crianças e de apoiarem a sua comunicação não são frequentes, revelando falta de intencionalidade (Barros & Aguiar, 2010; Barros & Leal, 2011; Barros et. al, 2016).
Uma agenda para a educação dos 0 aos 3
Décadas de investigação independente nos domínios da economia, das neurociências, da sociologia em geral e da sociologia da infância, da psicologia da aprendizagem, da antropologia, dos estudos urbanísticos e dos estudos feministas, etc. têm demonstrado que a decisão política sobre o atendimento ao nível etário dos 0 aos 3 anos deve ser informada pelos dados fornecidos pela investigação.
Assim, no âmbito das funções do Conselho Nacional de Educação (CNE), é fundamental insistir não apenas no alargamento e universalização da oferta educativa para as crianças dos 0 aos 3, nomeadamente nos grandes centros urbanos, mas em simultâneo sublinhar a necessidade de uma qualidade educativa dos diversos tipos de atendimento às crianças deste nível etário. Insistimos numa urgente revisão/intervenção “cirúrgica” na Lei de Bases de 1986 – sem a qual não será possível melhorar a qualidade pedagógica do atendimento - o que implica a consequente revisão da Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar (1997) substituindo-a por uma Lei-Quadro para a Educação de Infância.
No âmbito deste trabalho que nos foi pedido pelo CNE, vemos um conjunto de possibilidades que se podem constituir em linhas de ação futura:
• Introduzir o conceito de uma rede nacional para a educação e atendimento das crianças dos 0 aos 3 anos. Este conceito de rede nacional foi definido na Lei-Quadro de 1997 e decretos-lei e portarias subsequentes para as crianças dos 3 aos 6 anos. Esta rede nacional deverá conter creches públicas municipais que permitam a disseminação de centros de qualidade que possam inspirar e complementar outras iniciativas: IPSS e Misericórdias, autarquias e juntas de freguesia, cooperativas e ensino particular (infantários) ou ainda creches ligadas a escolas, a universidades e politécnicos, a empresas, etc. e dependerá, em termos organizativos e de financiamento numa complementaridade entre o MTSSS e o ME. Para melhor responder às especificidades de cada contexto esta Rede Nacional será de geometria variável.
• Garantir uma tutela pedagógica única por parte do Ministério da Educação (tal como aconteceu com as crianças de 3-6 anos), independentemente da iniciativa de origem, garantindo Orientações Pedagógicas para o Trabalho em Creche elaboradas pelo Ministério da Educação em concertação com os profissionais e em continuidade ou antecipando os princípios das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016) presentemente em vigor.
• Apontar para uma progressiva municipalização da educação dos 0 aos 6, de modo a garantir a resposta às necessidades locais quer das crianças quer das famílias, podendo essa responsabilidade ser assumida, nos grandes centros urbanos, ao nível da junta de freguesia, a quem cumprirá garantir que haja uma universalização do atendimento. Propomos que se faça uma espécie de cartografia (caracterização geográfica) das instituições. Para além de garantir a universalização do atendimento evita-se o desdobrar de serviços, alguns deles podendo estar duplamente financiados.
• No seguimento do ponto anterior haverá que rever a legislação em vigor que regula o funcionamento das creches e dos jardins de infância, a sua qualidade, bem como as condições laborais dos profissionais com vista a uma maior coerência interna das instituições que atendem famílias e crianças entre os 0 e os 6 anos.
• Garantir que a avaliação da qualidade e divulgação dos resultados das creches e Jardins de infância seja levada a cabo pela Inspeção Geral de Educação (IGE) reforçando, no entanto, as equipas de especialistas na educação dos 0 aos 6 anos, capazes de atender às suas especificidades.
• Contabilizar o tempo de serviço prestado por educadores/as que trabalham ou trabalharam em creche, enquanto serviço docente. Este reconhecimento evitará o “turn-out” das/os educadoras/es que, procurando melhores condições de trabalho, mudam frequentemente de instituição preferindo trabalhar em jardim de infância.
• Reconhecer a necessidade de permanência de uma educadora de infância no berçário da creche garantindo, em conjunto com as auxiliares, uma rotina que traga segurança, que seja repousante, mas simultaneamente estimulante para os bebés a partir dos 4 meses de idade, garantindo uma intencionalidade pedagógica.
• Desencadear uma revisão do regime de habilitação para a docência (Decreto-Lei nº 79/2014) no sentido de reequilibrar os pesos atribuídos às diversas disciplinas e os que se destinam a saberes da área de formação geral. Fomentar pós-graduações em universidades e politécnicos que capacitem os/as educadores/as para o trabalho específico no nível educativo dos 0 aos 3 anos e assegurem uma permanente investigação.
• Investir em políticas específicas de intervenção com famílias ou comunidades mais desfavorecidas, garantindo projetos de promoção da excelência pedagógica e comunitária adequadamente financiados.
• Sublinhar ainda a preocupação com as crianças migrantes e refugiadas, ou de minorias étnicas e socioeconómicas. A vivência num grupo heterogéneo sob o ponto de vista cultural e linguístico, mas também socioeconómico, contribuirá para a sua inserção progressiva numa sociedade que se quer inclusiva.
• Garantir a diminuição do número de crianças por adulto/a, no caso de crianças com necessidades educativas específicas ou em situação de desvantagem, respeitando direitos de aprendizagem diversificados (OCDE, 2006).
• Repensar o sistema de financiamento das creches e jardins de infância no sentido de diferenciar o apoio do Estado às famílias que tenham menores recursos; este sistema promoverá o acesso de todos e a sustentabilidade económica das IPSS evitando a recusa de vagas para crianças de famílias com menores recursos financeiros.
Terminamos este trabalho desejando que, desta vez e na presente legislatura, se tenha em atenção e se ponham em prática recomendações e estudos de há largos anos que sublinham o que aqui procurámos dizer. Não podemos perder mais tempo e recursos. As crianças e as suas famílias assim o exigem! Elas pedem-nos “estrelas maduras” que traspassem a solidão delas e de suas famílias.
Uma criança disse:
dá-me aquele ramo de estrelas maduras.(...)
A solidão que traspassa uma criança imóvel
É uma luz insuportavelmente branca.
(Herberto Hélder)
1 As autoras agradecem o contributo inestimável de colegas das universidades ou politécnicos, e de associações profissionais que, a nosso pedido, enviaram uma série de sugestões e alertas que enriqueceram o presente trabalho.
2 Universidade de Évora
3 Escola Superior de Educação de Lisboa
4 Instituto da Família e Ação Social (IFAS).
5 OCDE (2001)
6 da responsabilidade de uma das autoras do presente trabalho.
7 Trata-se de um conceito alargado de família e não apenas a família tradicional: pai, mãe e X filhos.
8 Instituições Particulares de Solidariedade Social
9 Ensino Particular e Cooperativo
10 SIC notícias, 26 de setembro de 2019
11 Os contratos de desenvolvimento foram uma modalidade legislativa criada no XIII Governo Constitucional no sentido de garantir o alargamento da rede de educação de infância dos 3 aos 6 anos a todas as crianças, mesmo em áreas geográficas onde não houvesse jardins de infância da rede pública ou da rede das IPSS, essas já financiadas pelo Estado
12 OCDE (2018). Family database PF1.6: Public spending by age of children
13 OCDE (2018). OECD Family Database PF3.2: Enrolment in childcare and pre-school
14 Nesta secção utilizaremos de forma atualizada um diagnóstico coordenado por uma das autoras e publicado em Folque, M. A., Tomás, C., Vilarinho, E., Santos, L., Fernandes-Homem, L., & Sarmento, M. (2016). Pensar a educação de Infância e os seus contextos. In M. Silva, B. Cabrito, G. L. Fernandes, M. C. Lopes, M. E. Ribeiro, & M. R. Carneiro (Coord.), Pensar a Educação: temas sectoriais (pp. 9-46). Lisboa: Educa.
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